“Neve era comum naquele fim de ano. E tal dia não estava sendo diferente do esperado, estava nevando até demais. A rua estava vazia, todos estavam acolhidos em suas casas tomando chocolate quente na frente da lareira. Na televisão, jornais precaviam os cidadães daquela pequena cidade que estava por vir a uma nevasca maior do que a pior nevasca que a cidade já enfrentara. Na rua, estavam só duas pessoas. Fazendo seu caminho de volta para casa. Talvez estivessem voltando do metrô. Não eram conhecidos, cada um andava de um lado da rua. O silêncio tomava conta da cidade, o que era um tanto quanto assombrador. Aquela pequena cidade, apesar de ser pouco habitava, vivia remexida, cheia de gente por tudo quanto é lado e nesse dia, tudo estava vazio. Era assustador o silêncio que ali fazia.
Fernando era uma das duas pessoas que estavam na rua. Ele era vendedor de uma pequena loja ali daquela cidade. Todos o conheciam. Ele tentava descobrir quem era a pessoa do outro lado da rua, numa cidade tão pequena como aquela, todos se conheciam. Mas algo estranho estava acontecendo, Fernando não sabia quem era a pessoa do outro lado da rua. Será um novo morador que nunca havia saído de casa? Será uma pessoa que está ali só de passagem? Ou será alguém que estava usando um belo de um disfarce? Fernando não sabia, e isso o deixou um tanto quanto confuso.
Ele era um moço simpático, não via problema em se aproximar das pessoas, até porque, era um vendedor. Sua conversa tinha de ser boa. Fernando resolveu então, ir até o outro lado da rua. Em alguns lugares as pequenas montanhas de neve o impediam de ir para o lado, isso fazia com que ele seguisse em frente até achar uma brecha para ir até o outro lado da rua.Quase do outro lado da rua, ele para, observa novamente aquela pessoa para ver se não era nenhum conhecido e tem uma única certeza. Ele nunca vira tal pessoa na cidade. Confuso, Fernando chegou mais perto e tentou começar uma conversa. Mas a outra pessoa, era um alguém de poucas palavras, alguém muito reservado, muito fechado, muito tímido.
— Desculpe-me a aproximação sem nenhum motivo. É que eu sou vendedor daquela loja ali embaixo. — disse Fernando apontando para o loja onde trabalha. — E eu queria saber se você está bem mesmo, nunca te vi, mas estava prestando atenção no teu jeito de andar e percebi que está um pouco cabisbaixa, e isso não me agrada.
Fernando era uma pessoa muito generosa, sempre estava se preocupando com os outros. Talvez isso o tornava um pouco chato, porque ele ficava no pé das pessoas até elas contarem a ele o que as afligia, o que as deixava de tal forma.
— Não é nada não. Só estou com um pouco de frio.
— Pega aqui a minha jaqueta, amanhã você me devolve. — Disse Fernando já tirando sua jaqueta de couro que estava por cima de um blusão de lã. —
— Não precisa, obrigada.
— Mesmo?
— É…
— Poderia me dizer uma coisa?
— Que coisa?
— Qual é o seu nome?
— Mariana.
— Se precisar, pode me contar o que acontece, Mariana. Com esse pouco tempo de experiências que venho tendo em minha vida, consigo ao menos ver quando alguém não está bem. E você parece estar muito mal. E eu me preocupo contigo, mesmo não te conhecendo. Pergunto-me o que uma tão bela moça, faz sozinha uma hora dessas na rua, e pergunto-me também o que vem te deixando assim. Teus olhos estão inchados pequena, andou chorando é?
— É, a gente não consegue ser forte o tempo todo não é mesmo?
— Realmente. Mas eu consigo ver em teus olhos que você está tentando ser forte, está tentando seguir em frente. Mas algo vem te prendendo ao teu passado. E que passado. Um passado cheio de dor, de angústia, agonia, sofrimento. Você é mais forte do que pensa sabia?
— Acho que não, sou fraca até demais. Veja só, estou contando meus problemas para uma pessoa que nunca vi na minha vida, estou desabafando com um desconhecido.
— Ei, e qual o problema disso? Você está mesmo precisando de ajuda, e eu estou tentando ao mínimo, tirar um sorriso sincero de você. Por favor, me conta o que aconteceu pequena.
— Sabe o Pedro? Aquele que mora na casa número 34?
— Sei sim, o que tem ele?
— Então, eu conheci ele no colegial, quando eu ainda era nova, eu tinha lá os meus quinze, dezesseis anos. Hoje encontro-me com vinte e quatro anos, e desses vinte e quatro anos, grande parte, sofri por esse canalha. A gente namorou sabe? Mas era aquela paixão adolescente, logo teve o seu fim.Ele me traiu, mas mesmo assim, não deixei de amá-lo, ele estava bêbado no momento, mas eu tive de terminar com ele. E sabe? Esses tempos atrás, nos reencontramos em um bar na cidade vizinha, ele tinha viajado para ir ver uma prima dele que por acaso, é minha vizinha. Conversamos muito sabe? Ele disse que ainda me amava e eu, é, eu ainda o amo. Vim até aqui para visitá-lo, só que quando cheguei na porta de sua casa, o flagrei aos beijos com Raquel, a menina com quem ele havia me traído. E eu não sei de mais nada. Não sei se sinto alguma coisa por ele ainda, se ainda resta algum sentimento meu por ele, é ódio, nada mais.
— Mariana, eu não sou bom com conselhos. Mas está ficando tarde e a rua é perigosa à noite. Se importa se formos para minha casa, tomar um banho quente e depois sentarmos na frente da lareira e tomar aquele bom e velho chocolate quente?
— Claro que não.
Chegando na casa de Fernando, ele pendura suas roupas cheias de neve em um cabide e diz para Mariana ir tomar um banho. Ele a espera sentado na frente da lareira, quando ele consegue fazer o fogo, Mariana sai do banheiro enrolada na toalha.
— Será que você poderia me emprestar alguma roupa sua? As minhas estão geladas, por conta da neve.
— Não, não tem problema, espera um pouco, vou pegar alguma coisa para você.
Fernando vai até o seu quarto, pega uma camiseta velha, um moletom grande e uma calça de moletom e entrega para Mariana. Logo depois, Fernando vai tomar seu banho e Mariana o espera sentada na frente da lareira, já acesa.
— Pronto. — Disse Fernando quebrando o silêncio que tomava conta dos quatro cantos daquele pequeno apartamento. —
Fernando foi até a cozinha preparar duas xícaras de chocolate quente. Ele as leva em uma bandeja até a sala onde estava Mariana, na frente da lareira.
— Então, está aquecida Mariana? — Disse Fernando entre um gole e outro em seu chocolate quente. —
— Estou sim.
— Desculpe-me não ter te ajudado em relação a aquele tal de Pedro. Mas é que não sou muito bom em conselhos amorosos.
— Não tem problema, já passa. Essa dor tem de ser passageira. — Disse Mariana um tanto quanto cabisbaixa. —
— Ei, olha aqui. — Fernando disse segurando o queixo de Mariana. —
Mariana ergueu sua cabeça. Os olhares dos dois se cruzaram e eles se beijaram. Era um beijo daqueles cheio de amor, de desejo, cheio de harmonia, cheio de paz, era um beijo que fazia os dois se sentirem completos.
Depois do beijo, Mariana fica um tanto quanto constrangida. E com a sua voz em um tom super baixo ela diz:
— Mas eu nem sei o teu nome…
— Fernando.
— Fernando. — Sussurrou Mariana umas três vezes. — Fernando. Então esse é o nome do homem que com um beijo, um só, foi capaz de me fazer esquecer Pedro, aquele homem que até então só me fazia sofrer. Fernando, é esse o nome. É esse o nome do homem da minha vida, o nome do homem que sabe como me fazer feliz, Fernando.
Os dois então triunfaram aquele momento com mais carícias, mais beijos, abraços. Tudo que um casal tem direito. Fernando mal iria saber que seu jeito todo generoso, iria fazer com que ele conhecesse a mulher de sua vida, Mariana.“
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By:Deborah Martins de Souza